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Espiritismo e política.

Qual a posição do Espiritismo com relação à política do mundo?



Em tempos de grandes polarizações sociais e políticas, ou em épocas de eleições e campanhas, é natural que as pessoas se posicionem partidariamente, de acordo com suas aspirações, pensamentos, ideologias e paixões.


O direito à liberdade de expressão e manifestação deve sempre existir para todos.


Entretanto, é importante sabermos bem usar os nossos direitos, a fim de que eles não se tornem, em nossas mãos, instrumentos de violência, perturbação e mal.


Em sua primeira carta à comunidade cristã de Corinto (1 Coríntios 6:12), o apóstolo Paulo asseverou, sabiamente: "todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas me convêm." Conhecedor da Lei de Deus, Paulo de Tarso sabia bem que, se todos os seres humanos gozam do direito divino ao livre-arbítrio, também estão todos submetidos à Lei de Causa e Efeito (ou de Ação e Reação). Em outras palavras, a semeadura é livre, mas a colheita do que plantamos é obrigatória. É evidente que, se não desejamos uma colheita de dores e aflições, convém selecionarmos bem as sementes que iremos distribuir pelos campos do mundo.


Antes de nos manifestarmos sobre qualquer assunto, apresentando nossas ideias, conceitos ou preconceitos, é fundamental que reflitamos sobre as possíveis implicações - para nós mesmos e para os outros - de nossos posicionamentos.


Além disso, uma outra questão de grande importância surge nesse contexto: política e religião combinam?


Se entendermos Política dentro do sentido filosófico encontrado na Grécia Antiga, como nos ensinos de Platão, em que o que se buscava era uma vivência comunitária virtuosa, com cada um da sociedade realizando esforços para o desenvolvimento de valores da alma, para que fossem eticamente cumpridos os seus deveres para o bem comum, então, encontraremos uma relação forte entre política e religião.


Mas, se pensarmos em política dentro da concepção atual, que visa atender exclusivamente aos interesses materiais, teremos religião e política em campos distintos de atuação e, muitas vezes, antagônicos.


Por isso mesmo, a mistura de política e religião resulta, quase sempre, em confusão e desastre.


A posição do Cristianismo é bastante clara a esse respeito: Jesus asseverou que não se pode servir a dois senhores ao mesmo tempo, a Deus e a Mamon, pois que se agradará a um e se desagradará a outro; e afirmou, também, que devemos dar a César o que é de César, e a Deus, o que é de Deus. Nessas duas afirmações, estabeleceu Ele uma clara distinção entre os interesses puramente materiais e os espirituais, sendo que os segundos têm sempre primazia e não devem se misturar com os primeiros.


O Espiritismo, que tem como base fundamental os ensinamentos de Jesus, não poderia propor nada diferente do Evangelho do Cristo, e, por isso, não trata, de nenhuma forma, de política partidária nem de ideologias políticas, as quais dizem respeito a questões meramente materiais, transitórias, enquanto a Doutrina ocupa-se do Espírito e das questões pertinentes à sua imortalidade, considerando a existência na Terra uma experiência transitória, que tem como objetivo oferecer oportunidade ao ser espiritual de expiar possíveis faltas cometidas no passado e de aperfeiçoar-se intelectual e moralmente.


No livro "O Consolador", o Espírito Emmanuel, comentando sobre como deveria se comportar o espiritista perante a política do mundo, afirmou que:


“o espiritista sincero deve compreender que a iluminação de uma consciência é como se fora a iluminação de um mundo, salientando-se que a tarefa do Evangelho, junto das almas encarnadas na Terra, é a mais importante de todas, visto constituir uma realização definitiva e real. A missão da doutrina é consolar e instruir, em Jesus, para que todos mobilizem as suas possibilidades divinas no caminho da vida. Trocá-la por um lugar no banquete dos Estados é inverter o valor dos ensinos, porque todas as organizações humanas são passageiras em face da necessidade de renovação de todas as fórmulas do homem na lei do progresso universal, depreendendo-se daí que a verdadeira construção da felicidade geral só será efetiva com bases legítimas no espírito das criaturas.” (in "O Consolador", pergunta 60, ed. FEB).


A proposta do Espiritismo é promover o progresso moral da Humanidade, por meio da transformação moral de cada ser humano. Nota-se, portanto, que é algo muito mais profundo que qualquer ideologia política ou programa político-partidário existente na Terra.


Nesse sentido, escreveu Kardec, o codificador da doutrina, que:


“há um elemento, que se não costuma fazer pesar na balança e sem o qual a ciência econômica não passa de simples teoria. Esse elemento é a educação, não a educação intelectual, mas a educação moral. Não nos referimos, porém, à educação moral pelos livros e sim à que consiste na arte de formar os caracteres, à que incute hábitos, porquanto a educação é o conjunto dos hábitos adquiridos. Considerando-se a aluvião de indivíduos que todos os dias são lançados na torrente da população, sem princípios, sem freio e entregues a seus próprios instintos, serão de espantar as consequências desastrosas que daí decorrem? Quando essa arte for conhecida, compreendida e praticada, o homem terá no mundo hábitos de ordem e de previdência para consigo mesmo e para com os seus, de respeito a tudo o que é respeitável, hábitos que lhe permitirão atravessar menos penosamente os maus dias inevitáveis. A desordem e a imprevidência são duas chagas que só uma educação bem entendida pode curar. Esse o ponto de partida, o elemento real do bem-estar, o penhor da segurança de todos.” (in “O Livro dos Espíritos”, comentário à resposta 685-a, ed. FEB).


Diante do exposto, fica fácil concluir-se que o espírita sincero, aquele que estudou e compreendeu o Espiritismo, permanece afastado de qualquer posicionamento ou atuação política apaixonada. Sabe ele que seus compromissos perante a vida são de ordem mais elevada e que seus comportamentos geram repercussões não apenas em si mesmo, mas também no meio que vive, atingindo outras pessoas, e, em razão disso, é zeloso em tudo o que diz e faz.


A questão é tão séria que Allan Kardec, ao redigir o Regulamento da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, inseriu nele um artigo, o de número vinte e sete, que diz o seguinte:


"Querendo manter no seu seio a unidade de princípios e o espírito de recíproca tolerância, a Sociedade poderá resolver a exclusão de qualquer de seus sócios que se constitua causa de perturbação, ou se lhe torne abertamente hostil, mediante escritos comprometedores para a Doutrina, opiniões subversivas, ou por um modo de proceder que ela não possa aprovar." (in "O Livro dos Médiuns", Allan Kardec, cap. XXX, ed. FEB).


A medida constante daquele regulamento tinha razão de ser, pois alguém que defendesse ideias contrárias ao Espiritismo e as praticasse na vida comum, não poderia ser considerado um verdadeiro espiritista, e sua atuação dentro de um Centro Espírita seria causa de perturbação interna, o que colocaria os trabalhos espirituais em grande risco. Em tudo, devemos agir com bom-senso e coerência.


Encerrando estas breves considerações em torno do tema, transcrevemos abaixo o texto de autoria do Espírito André Luiz, constante do livro “Conduta Espírita”, publicado pela Federação Espírita, no qual fica clara qual deve ser a conduta do espírita ante a política do mundo.


"NOS EMBATES POLÍTICOS"


"Situar em posição clara e definida as aspirações sociais e os ideais espíritas cristãos, sem confundir os interesses de César com os deveres para com o Senhor.

"Só o Espírito possui eternidade.

*

"Distanciar-se do partidarismo extremado.

"Paixão em campo, sombra em torno.

*

"Em nenhuma oportunidade, transformar a tribuna espírita em palanque de propaganda política, nem mesmo com sutilezas comovedoras em nome da caridade.

"O despistamento favorece a dominação do mal.

*

"Cumprir os deveres de cidadão e eleitor, escolhendo os candidatos aos postos eletivos, segundo os ditames da própria consciência, sem, contudo, enlear-se nas malhas do fanatismo de grei.

"O discernimento é o caminho para o acerto.

*

"Repelir acordos políticos que, com o empenho da consciência individual, pretextem defender os princípios doutrinários ou aliciar prestígio social para a Doutrina, em troca de votos ou solidariedade a partidos e candidatos.

"O Espiritismo não pactua com interesses puramente terrenos.

*

"Não comerciar com o voto dos companheiros de Ideal, sobre quem a sua palavra ou cooperação possam exercer alguma influência.

"A fé nunca será produto para mercado humano.

*

"Por nenhum pretexto, condenar aqueles que se acham investidos com responsabilidades administrativas de interesse público, mas sim orar em favor deles, a fim de que se desincumbam satisfatoriamente dos compromissos assumidos.

"Para que o bem se faça, é preciso que o auxílio da prece se contraponha ao látego da crítica.

*

"Impedir palestras e discussões de ordem política nas sedes das instituições doutrinárias, não olvidando que o serviço de evangelização é tarefa essencial.

"A rigor, não há representantes oficiais do Espiritismo em setor algum da política humana."


“Nenhum servo pode servir a dois senhores” – Jesus - (Lucas, 16:13)

(André Luiz, in “Conduta Espírita”, cap. 10, ed.FEB)


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